sexta-feira, 12 de outubro de 2012

A questão social urbana: reflexão inicial


A idéia nessa postagem é refletir, inicialmente, sobre as questões urbanas. Nesse sentido, apresentamos um resumo elaborado por João Bosco Torres Santos, como avaliação da disciplina Paisagens e Identidades Urbanas, do curso de Mestrado em Memória Social e Bens Culturais, intercalando-o, por meio de fotografias, com as percepções visuais dos componentes do Grupo Cultura Digital.
 Referência utilizada:
 IVO, Anete B.L. Questão Social e Questão Urbana: laços imperfeitos.  Caderno CRH. Salvador. V.23,n.58,p.17-33. Jan/Abr.2010.
Resumo:
Nesse artigo, a autora aborda as temáticas e os problemas relacionados às questões sociais e urbanas nas metrópoles contemporâneas, na América latina, inclusive no Brasil. Apresenta pontos contraditórios de convergência entre o social e urbano, da década de 80, analisando a literatura francesa contemporânea; desenvolve uma análise das classes sociais no espaço de estruturação urbana; apresenta o modo como a polarização da “questão social” sobre a cultura urbana se expressa nas noções de exclusão e de subclasses; discute o deslocamento da responsabilização social para o nível local das políticas e a relação entre o global e o local, além de demonstrar as ambigüidades e os dilemas manifestos na “incivilidade urbana”  e em seus atos de violência cotidiana. 

foto de: Bosco

Uma questão norteia as primeiras discussões no artigo: como conciliar os efeitos de uma densificação perigosa da população urbana, atendendo, ao mesmo tempo, aos objetivos do desenvolvimento econômico urbano-industrial? Assim, a partir da reflexão de diferentes autores sobre as problemáticas da urbanização e industrialização, aponta, como responsável, o urbanismo funcionalista que contribuiu com o processo de produção de novas periferias operárias, subordinando o uso dos espaços urbanos e a qualidade de vida de seus moradores, ao investimento do capital, a hegemonia das relações mercantis e a produção capitalista nas cidades. Desse contexto, emergem as lutas urbanas como movimentos de protestos e de demanda social por moradia e condições básicas de sobrevivência nas cidades, reivindicando o direito das classes populares à cidade e a legitimação social sobre o espaço. Tais conflitos desencadearam-se sob a ótica de uma abordagem marxista. Essa realidade, das lutas urbanas pelo direito à cidade versus a racionalidade industrial capitalista é conhecida por questão urbana clássica.

Canoas/RS
Em continuidade, aborda uma nova questão social, oriunda da reestrturação industrial e da “crise” do Estado de Bem-estar social, expressa no desemprego de massa e nas crescentes desigualdades sociais. Nesse novo cenário, manifestam-se duas noções distintas: a dos excluídos (na França) e dos underclass (nos Estados Unidos).
No caso da França, a pobreza persistente em meio ao crescimento econômico suscitou o surgimento da noção de excluído, como referência aos sujeitos incapazes de se adaptar socialmente como os deficientes físicos, inválidos, doentes mentais, crianças abandonadas, menores delinqüentes, suicidas, alcoólatras, vagabundos, prostitutas, entre outros. Uma percepção moral da pobreza inspirada na tradição da higiene e da assistência social, do século XIX, que inspira uma forma de tratamento do Estado-providência de caráter liberal. Com base nessa realidade, duas abordagens surgiram no intuito de ressignificar, redimensionar a noção de exclusão: a primeira procurou delimitar a população segundo campos simbólicos polares, partindo de quatro unidades de análise (a cidade – segmentação e fronteiras de convivência; a escola - a norma escolar; o emprego – o contrato do trabalho; e a proteção social –seguridade ou assistência) e a segunda a reconhecendo o desemprego como determinante central das novas questões urbanas.  
foto de: Bosco

Quanto aos Estados Unidos e a evolução da noção de underclass, diz que se baseia num diagnóstico individualizado da questão social e não numa visão estrutural de uma sociedade desigual. Segundo essa perspectiva, citando Ken Auletta (1981), identifica quatro categorias desses pobres: os pobres passivos, criminosos de rua, escroques e vagabundos. Afirma, ainda, que essa classificação é desenvolvida desde o século XIX, quando os pobres eram divididos em meritórios e não meritórios. Nesse sentido, citando Fassin (1996), acrescenta que na concepção underclass, os não meritórios são, em  sua maioria, da população negra, de origem rural, a quem  são associados traços estigmatizantes como passividade, irresponsabilidade, instabilidade e dependência. Em outras palavras, a noção de underclass constitui-se numa  visão moral da pobreza, com forte relações étnicas.
Desse modo, analisando as noções de exclusion (na França) e de underclass (Estados Unidos) a autora destaca uma relação que é o fato de se imporem ao mundo social e político apesar de não constituírem uma única e mesma problemática, além de se constituírem como ameaça aos princípios que organizam o mundo social urbano.
Conclui, então, que nos “(...) países de capitalismo avançado o principal problema é desenvolver novas atividades econômicas e formas de integração social alternativas ao estatuto salarial que já não se constitui num mecanismo garantido de inserção” (IVO; 2010, p. 26).
Atualmente, com a emersão de novos processos globais, baseados nas mudanças institucionais e no papel dos estados nacionais, oriundos da dinâmica da globalização, a autora alerta para as novas hierarquias urbanas e relações entre os territórios e as relações entre os espaços urbanos e seus habitantes: o público e o privado e seus usos. Apresenta a perspectiva liberal, nesse novo cenário, que pressupõe que a única via de retomada do crescimento  e da economia seria por meio da ruptura da articulação entre “emprego e proteção social”, sacrificando as conquistas sociais já adquiridas, a exemplo da reforma da previdência, reorientação dos programas estratégicos de assistência social na linha da pobreza. Assim, observa-se a reconversão da questão social de uma dimensão política de proteção, voltada à justiça social, para programas setorizados e focados na pobreza. Uma ruptura estrutural nos planos social, econômico e político.
 
Questão Social Urbana em Porto Alegre
Postado por Alini
O caso brasileiro de redemocratização associado à reconversão das novas regulações institucionais e de ajustes fiscais e econômicos, tem por efeito, causado a exclusão de grande número de trabalhadores. Tal exclusão não se resume à perda, mas também, se projetam nas poucas expectativas geradas às gerações futuras, configurando uma “exclusão da inserção”. Além do mais, no plano político as transformações não foram suficientes, causando uma crise de desconexão entre o aparelho da ação pública e a sociedade. Nessa conjuntura de desalinho econômico, político e social, aliado as dificuldades de inserção e sensação profunda de injustiça social, gera o crescimento da violência nos meios urbanos. Desse modo, a questão social desloca-se da esfera da proteção social, seguro social, para inserir-se no âmbito da questão de proteção civil, da ordem e segurança pública.

centro de Porto Alegre
foto: Bosco

centro de Canoas
foto: Bosco
Em síntese, o regime de exclusão, na contemporaneidade, tem multiplicado notícias e debates sobre a questão da violência urbana, em diferentes países. De um lado a falta de expectativas de emprego, a pobreza e precariedade de condições de acesso aos bens que possibilitem uma agregação dos indivíduos, nos centros urbanos, de outro, o excessivo estímulo aos consumos de massa, geram padrões explícitos de desigualdade, contradições e rupturas que favorecem a violência nas cidades, constituindo uma “sociedade incivil” (LANGRANGE; OBERTI, 1999). Desse modo, em conclusão, a autora afirma a necessidade de a “cidade” produzir “sociedade”, estabelecendo trocas sociais na partilha do espaço urbano.

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